18 de abril de 2024

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Tese “do poço ao posto” amplia a guerra



COMBUSTÍVEIS

Estudo sugere que postos comprem direto da refinaria e que as distribuidoras operem revendasTese “do poço ao posto” amplia a guerra
Um estudo com sugestões para redesenhar o mercado brasileiro de combustíveis ampliou o campo de batalha da guerra da gasolina.
O documento de 64 páginas, ao qual a Folha teve acesso, foi encomendado pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) à consultoria Arthur D’Little e está circulando em empresas e entidades que representam os elos do mercado.
Com o objetivo de reestruturar o setor no médio e longo prazo, o estudo propõe a desregulamentação do poço de petróleo à bomba de gasolina, abrangendo assim importação, refino, transporte, distribuição e comercialização.
Por esse modelo, os postos de gasolina passariam a poder comprar combustível direto da refinaria, e as distribuidoras teriam o direito de operar revendas.
A liberação viria acompanhada de uma fiscalização mais intensa pelos órgãos públicos, tanto em relação à qualidade de produto quanto ao caráter da concorrência, limpa ou predatória.
É nesse ponto que se concentra a forte reação dos donos de postos de gasolina. Eles acreditam que as grandes distribuidoras serão beneficiadas porque têm fôlego financeiro para atuar em todos os segmentos, justamente o que falta às pequenas empresas.
“A verticalização das atividades das distribuidoras compromete o mercado livre”, afirma a Fecombustíveis (Federação Nacional do Comércio Varejista de Combustíveis e de Lubrificantes) em ofício encaminhado a David Zylbersztajn, diretor-geral da ANP.
Para a entidade, isso geraria a cartelização do setor, levando à alta dos preços e prejudicando o consumidor.
Segundo a Fecombustíveis, a concentração na distribuição era de 98% no início da década. Mesmo com a abertura do mercado, ela ainda é alta -85% da distribuição continua nas mãos das cinco irmãs (BR, Shell, Esso, Ipiranga e Texaco).
“Não é salutar para a economia de qualquer país abrir as portas para que o oligopólio da distribuição estenda-se ao varejo”, argumenta a federação.
As distribuidoras discordam. “Sou a favor da verticalização. Não existe mercado livre sem competição”, diz Adhemar Berlfein, vice-presidente executivo do Sindicom (Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes).


Vínculos
Além de não ver possibilidade de formação de cartel, caso as distribuidoras venham a operar postos próprios, Berlfein defende a vinculação do posto à bandeira da distribuidora, o que, para ele, é uma forma de proteger o consumidor.
“O consumidor precisa saber a origem do combustível que está comprando. Ele não gostaria de tomar uma Pepsi numa garrafa de Coca-Cola”, argumenta.
No entender das distribuidoras, a expansão de suas atividades na comercialização não seria tão perigosa quanto os postos alegam. Isso porque o estudo propõe limites à liberalização: qualquer empresa do setor poderia operar sozinha até 10% do total de revendas no mercado ou 18% do volume de combustível vendido por empresa e por Estado.
A Fecombustíveis rebate, argumentando que o estudo não traz critérios claros para fazer com que as distribuidoras respeitem esse limite. “Em quanto tempo os 10% se tornariam 100%?”, questiona a federação no ofício.
Para outras entidades, antes de discutir a verticalização do setor é preciso pôr um fim na guerra de preços que coloca em risco o livre mercado, como abordou a Folha na edição de domingo passado.
A reportagem apurou que, por trás dos descontos na bomba de gasolina, há adulteração de combustível, sonegação de impostos, liminares obtidas na Justiça para não pagar tributos e esquema de descontos que favorece apenas alguns postos de uma mesma bandeira numa certa área, ameaçando a sobrevivência dos demais.
Os postos reivindicam tratamento igual pelas distribuidoras com as quais mantêm vínculo. “O poder de manipulação dos preços que elas têm pode comprometer a sobrevivência das revendas”, afirma José Alberto Paiva Gouveia, presidente do Sincopetro (Sindicato do Comércio Varejistas de Derivados de Petróleo do Estado de São Paulo) em ofício à ANP.
Do que o Sincopetro não reclama é da possibilidade de o posto poder comprar combustível diretamente da refinaria, como propõe o estudo.
Retalhistas
A liberação proposta pelo estudo da Arthur D’Little facilita a entrada de mais um competidor no varejo. É o transportador revendedor retalhista (TRR, no jargão do mercado), que fornece diesel, querosene e óleo combustível em grandes quantidades para empresas, como hospitais, indústrias e transportadoras.
Hoje, os retalhistas são proibidos de operar no varejo de gasolina e álcool hidratado. Para a Feparcom, federação paulista de revendedores, não se justifica a presença dos retalhistas no mercado dos postos porque eles já têm a sua clientela.
A Fecombustíveis bate na mesma tecla. A entrada dos retalhistas na venda de gasolina e álcool foi considerada inconveniente após análise da proposta por todos os seus sindicatos associados.
De outro lado, a entidade entende que, da mesma forma que o retalhista não deve invadir a área do posto, o revendedor não pode levar combustível na casa do consumidor.


Emprego

Outro ponto que a Feparcom contesta é a autorização para a expansão do self-service nos postos do país. Em ofício encaminhado à ANP, a federação pede a suspensão do auto-serviço por um prazo de cinco a dez anos, até que a taxa de desemprego no país recue dos atuais 7,8% da população economicamente ativa, segundo o IBGE, para 5%.
“O custo de mão-de-obra consome perto da metade da margem de revenda. Se a distribuidora abrir posto próprio com bombas operadas pelo consumidor vai poder baixar o preço mais ainda, prejudicando quem emprega”, diz José Camargo Hernandes, presidente da Feparcom.
Cada um dos 25 mil postos de combustíveis espalhados pelo país emprega dez frentistas, em média -cerca de 250 mil pessoas no total. “Se os postos quebrarem, vai ter muito mais gente desempregada.”
O estudo da Arthur D’Little toma por base os exemplos de mercado livre em seis países -Argentina, Estados Unidos, França, Espanha, Colômbia e Austrália.
FÁTIMA FERNANDES
LUCIA REGGIANI
da Reportagem Local

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